ENTREVISTA - JORGE FIALHO FAUSTINO
- O que o motivou a ser Administrador da Insolvência?
Depois de 20 anos a desempenhar cargos de Direcção de Empresas, como Administrador e Director Geral, pretendi dar outro rumo à minha vida profissional, conciliar as competências adquiridos com novos desafio, poder majorar conhecimentos e competências em áreas tão distintas como todas aquelas que resultam dos diversos processos de insolvência para que tenho sido nomeado. Estou inscrito desde 1996 primeiro como liquidatário no âmbito do CPEREF e depois como Administrador da Insolvência.
- Os jornais anunciam que o número de processos de insolvência tem aumentado. Nota um aumento de volume de processos no seu trabalho?
Pela forma muito profissional com que encaro esta actividade, tenho tido um aumento muito significativo do número de processos de insolvência para que sou indicado. Apesar de nem sempre os Magistrados aceitarem as indicações propostas tanto pelos credores como pelos devedores, registo, mesmo assim, um substancial aumento do número de processos para os quais sou nomeado.
- Considera o actual Código de Insolvência e Recuperação de Empresas – CIRE– capaz para responder à realidade dos processos de insolvência?
Considero que o CIRE versus CPEREF foi uma evolução. Não sendo contudo uma inovação, procurou-se emancipar um pouco as insolvências da esfera judicial, dando-lhes alguma autonomia processual. Contudo, a realidade económica sofreu, nos últimos anos, uma tremenda transformação que está a comprometer o espírito do legislador. Apesar disso, considero que, na actual conjuntura, o CIRE responde muito melhor aos anseios de todos os intervenientes.
- Considera que o sistema judicial se encontra dotado dos meios humanos e materiais para responder aos processos de insolvência?
Se o Sistema Judicial Português não dispõe dos meios humanos e materiais para a generalidade dos processos, como poderá dispor para processos tão específicos como os de Insolvência? Mesmo os tribunais do comércio, em que se pretendeu que existisse uma especialização, têm, pela enxurrada de processos, vindo a perder muito da sua capacidade e essência. Sendo o CIRE um código novo com conceitos e especificações muito próprias, e não existindo ainda muita doutrina sobre o mesmo, deparamo-nos muitas vezes com interpretações muito díspares, pelo que a conjugação de falta de meios do sistema judicial com o desafio que constitui este código, nem sempre facilitam o trabalho a quem dele tem necessidade de a ele recorrer.
- As especificidades de um processo de insolvência de pessoas singulares e colectivas são as mesmas?
Direi que a uma das grande diferença reside no consagrado no art. 235º e seguintes, do CIRE, nomeadamente no que se refere à “ exoneração do passivo restante”, que consiste na possibilidade de permitir o renascer do insolvente singular, o que não é mais que a conjugação, de forma inovadora, do princípio fundamental do ressarcimento dos credores, com a atribuição aos devedores singulares insolventes da possibilidade de se libertarem de algumas das suas dívidas, permitindo-lhes a sua reabilitação económica. O princípio do fresh start para as pessoas singulares de boa fé incorridas em situação de insolvência, tão difundido nos Estados Unidos, e recentemente incorporado na legislação alemã da insolvência, é entre nós acolhido, através do referido regime da “exoneração do passivo restante”.
- Tendo uma longa experiência em insolvências colectivas, qual têm sido as maiores dificuldades que tem sentido em termos de legislação?
Direi que a maior dificuldade é a falta de articulação/consenso entre o que está consagrado no CIRE e o sistema fiscal. Por inércia ou desconhecimento, perde-se, por vezes, muito tempo com questões fiscais de empresas que já não têm actividade, nem tão pouco informação contabilística. Enfim, direi que é exigido ao Administrador da insolvência um conjunto de procedimentos que, a meu ver, não têm qualquer razão de ser. Considero que seria vantajoso que fosse feita a devida distinção legislativa entre os deveres do contribuinte nas situações de activo e de insolvente para que tal não continue a ser exigido ao Administrador da Insolvência, o qual, muitas vezes, não dispõe de informação suficiente para responder ao que lhe é exigido pela Administração Fiscal.
- Entende a insolvência como um fim?
É óbvio que é sempre um fim, mas também deverá ser vista como um início, um princípio, uma oportunidade de fechar um ciclo e iniciar uma nova vida. Dramático é, muitas vezes, não se terem tomado as medidas adequadas em tempo útil e continuar a acreditar ou a apostar em projectos e fórmulas de vida e resolução de situações que há muito estão esgotadas. Muitas vezes, renascer é mais fácil do que apostar em situações ou causas que já perderam há muito a sua essência. Penso, pois, que o papel do Administrador da Insolvência é fundamental, tendo, muitas vezes, que conciliar diversas valias e múltiplos interesses, não se desviando nunca de uns dos principais objectivos, que passa por acautelar os interesses dos credores.
*Jorge Fialho Faustino, Licenciado em Gestão de Empresas pelo ISCTE, Técnico Oficial de Contas, Consultor para a área da recuperação de empresas e Administrador da Insolvência. Email: Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar.