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GARANTIAS BANCÁRIAS NÃO ACCIONADAS PODEM SER RECLAMADAS

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Por Luís M. Martins, Advogado*.

As Garantias Bancárias são operações de crédito através da qual o Banco garante a execução de uma obrigação constituída por um seu Cliente (ordenador ou devedor principal) perante um terceiro (beneficiário), assumindo por isso o encargo da obrigação se o ordenador faltar ao seu cumprimento.

Sobre a sua distinção escreve no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto Apelação nº 5064/08 - 3ª Sec. de 02/10/2008 “ …A garantia bancária é o contrato em que o garante não se obriga a satisfazer uma dívida alheia mas a assegurar ao beneficiário determinado resultado, traduzido no recebimento de certa quantia em dinheiro. Podendo ser simples ou à primeira solicitação, a sua distinção assume especial importância pelas diferentes consequências próprias da acessoriedade e da autonomia, com reflexo decisivo no destino da causa.

Assim, a garantia acessória (ou simples), a que primitivamente surgiu nos ordenamentos jurídicos, com o sentido de que ao credor interessa o cumprimento e não os processos coadjuvantes destinados a facultá-lo, está funcionalmente ligada ao crédito garantido, sendo afectada pelas vicissitudes da relação contratual que está na sua génese, desde logo não sendo válida se o não for a obrigação principal e sendo lícito ao garante opor ao credor todos os meios de defesa que pudessem ser opostos pelo devedor garantido (cf. v.g. em relação à fiança, paradigma deste tipo de garantias, os artºs 632º, nº 1 e 637º, nº 1 do CC).

A garantia autónoma é, no essencial, um contrato outorgado entre o mandante da garantia e o garante, a favor de um terceiro, o beneficiário, só podendo o garante opor a este as excepções que constem do próprio texto da garantia, mas já não as derivadas da relação contratual que está na base daquela

Quanto ao seu processo de formação, uma garantia bancária, seja ela simples (acessória) ou autónoma, assenta numa relação comercial tripartida:

1) relação entre o devedor mandante da garantia e o beneficiário, que é o contrato base;

2) relação entre o mesmo mandante e o Banco garante, pelo qual aquele mandata (mandato sem representação) este para emitir a garantia a favor do beneficiário;

3) relação entre o Banco e o beneficiário e que é consubstanciada na garantia em si, pela qual aquele se obriga a pagar a este a quantia garantida caso o afiançado não cumpra as suas obrigações….”

Quando uma empresa entra em insolvência, pode suceder que existam garantias bancárias – a favor de diversas entidades, que ainda se encontram em vigor e que, o banco, está obrigado a honrar/pagar, caso venha a ser chamado para o efeito.

É certo que, se ainda não foram accionadas, ainda não houve “crédito” concedido à insolvente o que poderá levar a concluir que: se não existe crédito efectivamente concedido, o Banco não pode reclamar o seu valor na insolvência via reclamação de créditos.

A resposta está no art.º 50.º e 181.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas – CIRE.

O artigo 50.º considera créditos sob condição suspensiva aqueles cuja constituição ou subsistência se encontrem sujeitos à verificação ou á não verificação de um acontecimento futuro e incerto por força da lei ou de negócio jurídico.

Dispondo o artigo 181.º que os créditos sob condição suspensiva são atendidos pelo seu valor nominal nos rateios parciais, devendo continuar, porém, depositadas as quantias que por estes lhes sejam atribuídas, na pendência da condição. Logo, porque qualquer um dos beneficiários da garantia pode, a qualquer momento, solicitar o seu pagamento, estes créditos podem e devem ser reconhecidos como créditos sob condição suspensiva retendo-se, cautelarmente, as quantias que lhe sejam atribuídas, sendo estas apenas distribuídas quando a condição se verificar – se isso vier a suceder.

Neste artigo aborda-se um tema geral sobre o direito da insolvência, com o distanciamento do caso concreto, prestando-se um serviço social e de divulgação de informação jurídica (cfr. artigo 20.º, n.º 2, da Constituição).

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LM 2Autor do Artigo: Luís M. Martins
Profissão: Advogado
Perfil: Exerce a sua atividade com especial incidência na área do direito da insolvência, reestruturação e recuperação de empresas e pessoas singulares. É membro da Insol Europe (Association of Europe Insolvency lawyers an accountants specialising in corporate recovery and bankruptcy).
Nota curricular: Autor de inúmeras intervenções, artigos sobre insolvência e recuperação de empresas e pessoas singulares. Autor dos seguintes livros: “RECUPERAÇÃO DE PESSOAS SINGULARES” (Editora Almedina, 2011), “PROCESSO DE INSOLVÊNCIA ANOTADO E COMENTADO” (Editora Almedina, 2ª Edição), “CÓDIGO DA INSOLVÊNCIA E DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS” (Editora Almedina, 2010), “INCUMPRIMENTO DO CONTRATO DE TRABALHO” (Editora Verlag dashofer, 2007, 3ª edição), “REGIME JURÍDICO DOS FUNDOS DO INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO – ANOTADO E COMENTADO” (Editora Vida Imobiliária, 2006), “MANUAL PRÁTICO DE DIREITO DO TRABALHO” (Editora Verlag Dashofer, 2006),MANUAL PRÁTICO PARA A GESTÃO DAS ACTIVIDADES IMOBILIÁRIAS” (Editora Verlag Dashofer, 2006), “CÓDIGO COOPERATIVO - ANOTADO" (Editora Vida Económica, 2005, 2ª edição), “CÓDIGO DA INSOLVÊNCIA E DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS - ANOTADO” (Editora Vida Económica, 2004, 2ª edição). Saber mais sobre o autor