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OS CRÉDITOS, OS CREDORES, A INSOLVÊNCIA E O RATEIO - II

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Por Luís M. Martins e Mariana Vasconcelos, Advogadosgrupo de maos juntas para trabalho em equipe 34141 432. "...Com excepção da consignação de rendimentos, encontra-se prevista, para as restantes garantias reais a respectiva preferência no pagamento. A regra dita que os créditos serão graduados de acordo com a prioridade do registo, todavia a hipoteca “cede” perante o privilégio especial (ex. trabalhadores em alguns casos) e o direito de retenção – conjugação do disposto nos Arts. 686º, 754º, 755º e 756º todos do CC...". A Primeira parte do artigo está disponível aqui.

GARANTIDOS

«Garantidos» serão os créditos, e respectivos juros, que beneficiem de garantias reais, onde se incluem os privilégios creditórios especiais, sejam estes mobiliários ou imobiliários, sobre bens integrantes da massa insolvente,e os privilégios creditórios gerais até ao montante correspondente ao valor dos bens objecto das garantias. A «garantia» pode ter natureza pessoal ou real, neste último caso, fica o credor com direito de se pagar, com preferência a qualquer outro, pelo valor, ou pelos rendimentos de certos bens do devedor ou de terceiros.

O «privilégio creditório» consiste no direito que a lei reconhece a um credor, em atenção à causa do seu crédito, de ser pago preferentemente aos outros credores, independentemente de registo. Será imobiliário ou mobiliário consoante a sua incidência (imóvel ou móvel), e geral ou especial consoante o seu alcance (sobre um universo de bens ou sobre um bem especifico).O privilégio imobiliário especial nos termos do disposto no Art. 751º do CC é oponível a terceiro que adquira o prédio ou direito real sobre ele e preferem à consignação de rendimentos, à hipoteca ou ao direito de retenção, ainda que estas garantias sejam anteriores. Estes serão os créditos – após cumprimento do disposto no Art. 172º do CIRE, – que serão satisfeitos em primeiro lugar (1).

Dentro da categoria dos créditos garantidos encontramos o direito de retenção (Art. 754º do CC), a hipoteca (Art. 686º do CC), o penhor (Art. 666º do CC) e a consignação de rendimentos (Art. 656º do CC).

Estatui o Art. 174º do CIRE que há que respeitar, no pagamento aos credores, a prioridade que lhes cabe.

No âmbito dos privilégios imobiliários preceitua o Art. 744º do CC que IMI, IMT, Imposto de sucessões e doações (quando incidam sobre bens imóveis), têm privilégio, respectivamente, sobre os bens cujos rendimentos estão sujeitos à respectiva contribuição e sobre os bens transmitidos.

Com excepção da consignação de rendimentos, encontra-se prevista, para as restantes garantias reais a respectiva preferência no pagamento. A regra dita que os créditos serão graduados de acordo com a prioridade do registo, todavia a hipoteca “cede” perante o privilégio especial (ex. trabalhadores em alguns casos) e o direito de retenção – conjugação do disposto nos Arts. 686º, 754º, 755º e 756º todos do CC.

PRIVILEGIADOS

Os créditos privilegiados são os que gozam de privilégios creditórios gerais sobre bens integrados na massa insolvente, quando tais privilégios não se extingam por efeito da declaração de insolvência.

Serão os privilégios gerais, mobiliários ou imobiliários que se encontram regulados, respectivamente, nos Arts. 736º e ss. do CC.

Não obstante o CC no Art. 735º, n.º 3 estatuir que os privilégios imobiliários nele previstos são sempre especiais, por lei avulsa (ex. código do trabalho) foram criados os privilégios imobiliários gerais.

Dos privilégios imobiliários gerais fazem parte os créditos garantidos onde se incluem o IRC, IRS e IVA, contribuições e juros para a Segurança Social, cujo pagamento é feito à custa dos bens (móveis) não afectos a garantias reais prevalecentes, com respeito da prioridade que lhes caiba, e na proporção dos seus montantes, quanto aos que sejam igualmente privilegiados (Art. 175º do CIRE) e cuja ordem de graduação se encontra estipulada nos Arts. 745º a 747º do CC.

Tal como sucede relativamente ao privilégio especial, o crédito mobiliário geral dos trabalhadores (Art. 377º, n.º 1 a) do CT) prevalece sobre os demais créditos mobiliários, nos termos do disposto no Art. 377º, n.º 2 a) do CT.

Este privilégio (geral) não é oponível a qualquer direito real anterior ou posterior ao débito garantido (vide Art. 749º do CC), contrariamente ao privilégio imobiliário especial ( vide Art. 751º do CC).

Nesta categoria estão também incluídos, nos termos do disposto no Art. 736º, n.º 1 do CC, os créditos do Estado, das autarquias locais e ainda os elencados no Art. 737º do mesmo diploma legal.

COMUNS

Serão todos os créditos que não caibam em nenhuma outra classe ou categoria. A única preferência de que beneficiam os credores, titulares deste crédito, é a de serem pagos antes dos credores titulares de créditos subordinados, no entanto são preteridos face às dívidas da massa e aos créditos garantidos e privilegiados.

SUBORDINADOS

Os créditos subordinados são créditos cujo pagamento tem lugar apenas depois de integralmente pagos os créditos comuns que, por sua vez, só serão pagos depois de integralmente satisfeitos os garantidos e os privilegiados.

A natureza subordinada deve-se, por exemplo, ao carácter meramente acessório do crédito [é o caso dos juros (2)], ou de ser assimilável a capital social (ex. suprimentos), ou ainda de este se apresentar desprovido de contrapartida por parte do credor.

São ainda considerados subordinados os créditos cujos titulares sejam «pessoas especialmente relacionadas com o devedor» (seja ele pessoa singular ou colectivas) quais são criteriosamente indicadas no artigo 49.º procurando-se assim combater o aproveitamento, por parte do devedor (3), de relações orgânicas ou de grupo, de parentesco, especial proximidade, dependência ou outras, para praticar/a prática de actos prejudicais aos credores.

(1) Antes de serem pagos os credores, titulares de créditos sobre a massa insolvente, , segundo o disposto no Art. 172º do CIRE o administrador da insolvência deduz da massa insolvente os bens ou direitos necessários à satisfação das dívidas desta, incluindo as que previsivelmente se constituirão até ao encerramento do processo, constantes do Art. 51º do CIRE. Estas são assim, pagas em primeiro lugar e com prevalência sobre todos os créditos seja qual for a sua natureza.

(2) Deverá ter o credor atenção para o facto de os juros de créditos não subordinados, constituídos após a declaração de insolvência, passarem a subordinados (Art. 48º, n.º b) 1a parte do CIRE), com excepção dos abrangidos por garantia real e por privilégios creditórios gerais, mas estes apenas até ao valor dos respectivos bens (Art. 48º, n.º 1 b) 2a parte do CIRE).

(3) Nos termos do disposto no Art. 177º, n.º 1 do CIRE o pagamento dos créditos subordinados só tem lugar depois de integralmente pagos os créditos comuns, e é efectuado pela ordem segundo a qual esses créditos são indicados no artigo 48.º, na proporção dos respectivos montantes, quanto aos que constem da mesma alínea, se a massa for insuficiente para o seu pagamento integral. Com a especialidade, prevista no n.º 2 daquele mesmo preceito legal, de, no caso de subordinação convencional, ser lícito às partes atribuírem ao crédito uma prioridade diversa da que resulta do artigo 48.º.

Neste artigo aborda-se um tema geral sobre o direito da insolvência, com o distanciamento do caso concreto, prestando-se um serviço social e de divulgação de informação jurídica (cfr. artigo 20.º, n.º 2, da Constituição).

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LM 2Autor do Artigo: Luís M. Martins
Profissão: Advogado
Perfil: Exerce a sua atividade com especial incidência na área do direito da insolvência, reestruturação e recuperação de empresas e pessoas singulares. É membro da Insol Europe (Association of Europe Insolvency lawyers an accountants specialising in corporate recovery and bankruptcy).
Nota curricular: Autor de inúmeras intervenções, artigos sobre insolvência e recuperação de empresas e pessoas singulares. Autor dos seguintes livros: “RECUPERAÇÃO DE PESSOAS SINGULARES” (Editora Almedina, 2011), “PROCESSO DE INSOLVÊNCIA ANOTADO E COMENTADO” (Editora Almedina, 2ª Edição), “CÓDIGO DA INSOLVÊNCIA E DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS” (Editora Almedina, 2010), “INCUMPRIMENTO DO CONTRATO DE TRABALHO” (Editora Verlag dashofer, 2007, 3ª edição), “REGIME JURÍDICO DOS FUNDOS DO INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO – ANOTADO E COMENTADO” (Editora Vida Imobiliária, 2006), “MANUAL PRÁTICO DE DIREITO DO TRABALHO” (Editora Verlag Dashofer, 2006), MANUAL PRÁTICO PARA A GESTÃO DAS ACTIVIDADES IMOBILIÁRIAS” (Editora Verlag Dashofer, 2006), “CÓDIGO COOPERATIVO - ANOTADO" (Editora Vida Económica, 2005, 2ª edição), “CÓDIGO DA INSOLVÊNCIA E DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS - ANOTADO” (Editora Vida Económica, 2004, 2ª edição). Saber mais sobre o autor